suzano papel e celuloseDepois dos EUA, Suzano busca aval à fusão com Fibria em outros países

Três meses depois de assinar o acordo de compra da Fibria, a Suzano Papel e Celulose está se movimentando junto a órgãos antitruste em três continentes para garantir o aval à operação, que dará origem a um gigante mundial de celulose. A expectativa de consultores e analistas ouvidos pelo Valor é a de que o negócio não encontrará resistência, a exemplo do sinal verde dado recentemente pelos Estados Unidos.

Por Stella Fontes | De São Paulo
Ainda assim, o acordo de acionistas prevê que a Suzano poderá vender até 1,1 milhão de toneladas em ativos da Fibria, ou 10% da capacidade combinada de produção de celulose de mercado, caso haja imposição por parte dessas autoridades, e consumar o negócio. Além desse volume, a Suzano poderia optar por seguir na operação ou se retirar mediante pagamento de multa de R$ 750 milhões.

 

No Brasil, apurou o Valor, os esforços estariam voltados a demonstrar para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que a concentração em celulose seria apenas aparente. O fato de os preços praticados no país serem formados a partir de uma combinação de cotação na Europa e câmbio deve ser usado pela Suzano a favor da aprovação sem “remédios” estruturais.

Tipicamente, o preço doméstico leva em conta a cotação da matéria-prima na terceira semana do mês anterior no mercado europeu, multiplicado pelo câmbio médio ao longo daquele mês. O valor é publicado pela consultoria Foex, cujo índice de preços é referência para a indústria mundial.

Outro argumento deve ser a concorrência acirrada no mercado doméstico. Vendas internas possibilitam aos produtores, eminentemente exportadores, monetizar créditos de ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), o que acaba estimulando a disputa por esses clientes.

Procurada, a Suzano informou por meio de assessoria de imprensa que não comenta o assunto devido ao processo estar em andamento. No anúncio da transação, em março, o comando da empresa controlada pela família Feffer expressou confiança na aprovação do negócio, sem a necessidade de venda de ativos.

Na defesa junto ao Cade, a tese seria a de que o mercado relevante é o de celulose química, incluindo fibra curta e fibra longa. Mas a jurisprudência indica que, no Brasil, o mercado que não é atendido por ao menos 30% de importação é interno, o que deve levar a companhia a adotar uma abordagem diferente daquela escolhida em outros países.

Ao mesmo tempo em que 90% da produção brasileira de celulose é exportada, o mercado doméstico é abastecido basicamente pelas fábricas locais. Segundo dados da consultoria RISI e da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), que representa os fabricantes, a produção de celulose química no país foi de 22,5 milhões de toneladas no ano passado, das quais 19,8 milhões de toneladas de fibra curta. A demanda total, por sua vez, foi de 1,9 milhão de toneladas.

Juntas, Suzano e Fibria teriam participação no segmento de celulose de eucalipto da ordem de 56%. Mas, ao excluir as duas companhias do mercado doméstico, seus concorrentes têm capacidade para suprir em quase cinco vezes a demanda brasileira.

Fora do país, apurou o Valor ,a abordagem seria a de que o mercado relevante é global e compreende a celulose química, tanto de fibra curta quanto de fibra longa. Nesse segmento, a “nova” Suzano, resultante da combinação dos ativos das duas companhias, terá participação não superior a 15%, com capacidade anual de 11 milhões de toneladas por ano de celulose de mercado. Trata-se de produto vendido a terceiros e não integrado à fabricação de papel. Se levado em conta o mercado global de fibras (virgem e reciclada), a fatia é ainda menor, entre 5% e 6% do total.

Na opinião de uma fonte, essa parece ter sido também a interpretação da Federal Trade Commission (FTC) e do Departamento de Justiça (DoJ) órgãos americanos, que já aprovaram a operação.

Além de Brasil e Estados Unidos, são consideradas essenciais à operação as aprovações de órgãos antitruste da Europa e da China — hoje a maior compradora da celulose produzida no país. A Suzano terá ainda de buscar o aval da Turquia.

O volume considerado aceitável em caso de eventual necessidade de venda de ativo, previsto na cláusula IX do acordo de acionistas — que é público e foi assinado em 15 de março —, gerou interpretações no mercado. A percepção entre fontes ouvidas é a de que a Suzano teria indicado com esse volume de 1,1 milhão de toneladas que, em caso de um eventual remédio estrutural à operação, poderia abrir mão da fábrica da Fibria em Jacareí (SP), cuja capacidade produtiva é justamente essa.

A unidade, conforme essas fontes, tem custo de produção mais elevado e ofereceria sinergias, geradas a partir da consolidação com a Suzano, menores do que outros ativos. Além disso, ali as possibilidades de expansão são mais limitadas. A empresa não tece comentário sobre essas informações.

O acordo para compra da Fibria pela Suzano, que por enquanto compreende um compromisso de voto firmado entre os acionistas controladores — Votorantim e BNDESPar, da primeira companhia, e a família Feffer —, dará origem à maior empresa brasileira do agronegócio. A Suzano vai pagar aos acionistas da Fibria um total de R$ 29 bilhões em dinheiro, corrigidos pelo CDI, mais 0,4611 ação de sua emissão por papel da Fibria, em operação que deve ser concluída entre o fim deste ano e o início de 2019.

VALOR ECONOMICO - BRASIL - 15 junio 2018